Pequena biografia da minha dor
Nesse momento eu deveria estar trabalhando em cima dos textos que irão compor a reedição do Dinheiro Sem Medo, meu primeiro livro. Digo, eu realmente deveria, não tem absolutamente nenhuma tarefa profissional mais importante do que essa.
Mas nesse momento não consigo escrever porque sinto dor, muita dor.
Não é uma dor existencial, filosófica, intangível e profunda, como se espera de alguém que escreve, é só uma dor na lombar. Uma dor intensa, é verdade, que me impede de pegar os brinquedos da minha filha do chão, mas ainda assim, é só uma dor na lombar.
Toda vez que desabafo sobre minha dor para Gabriela, ela, com razão, me lembra que pariu um bebê por vias normais e eu consigo ler no seu olhar a continuidade não dita: “homem é um bicho fraco pra cacete, meu deus”. A parte dura dessa interação triste é que ela tem razão.
Mas hoje eu te honrarei, ó dor na lombar, companheira de literalmente todas as horas, hoje sua existência será valorizada. Não só te dedicarei minha procrastinação literária – sinta-se honrada –, como irei expor ao mundo um retrospecto da sua existência.
Nascida em 2014, ano em que completei 27 anos, te considero bastante versada no planejamento, prova disso é que você enriqueceu, mesmo começando de baixo. Você fez do meu calcanhar sua primeira morada, uns te chamavam de esporão calcâneo, outros de fascite plantar.
Com o tempo você ascendeu e hoje é uma grande latifundiária, dona de muitas casas, embora prefira passar a maior parte do ano nas minhas costas. Aparentemente é bastante confortável, eu imagino que você goste de contar com o espaço amplo compreendido entre meu quadrado lombar e meus glúteos.
Por certos períodos, te considerei uma inquilina discreta. Não fazia barulho, não furava paredes, não destruía móveis. Sempre lidou mal com a falta de limites, porém. Sempre foi intolerante com minha adicção, nunca se mostrou compreensiva em relação aos traços de dependência esportiva apresentados por mim, que com tanta generosidade te recebi. Quando jovem, fazia aparições pontuais. Passava um final de semana aqui, outro final de semana ali, nunca se alongava demais. Sinto que tudo escalou rapidamente.
Gosto de atribuir seu crescimento exponencial à sarcopenia, ou seja, a perda muscular esquelética natural, decorrente do envelhecimento, mas, entre nós, confesso que é meio que uma safadeza. A verdade é que sempre gostei muito mais do esporte do que da preparação física.
Corria mais de 100km por semana não por zelo, não por cuidado com meu corpinho, e sim porque acho uma delícia me sentir fisicamente exausto. Estou completamente habituado a construir minha vida ao redor do esporte.
Você não me perdoou. Depois da temporada em meu calcanhar, fez um puxadinho no meu ombro, fez com que eu aceitasse que cada hora dentro da quadra de handebol geraria uns dias sem conseguir erguer o braço direito, sem conseguir lavar minha própria cabeça. Um golpe duro, uma amostra do seu poder ditatorial.
Em tempo, perceba que essa biografia é sua, mas você é tão pervasiva que, mesmo falando de você, falo de mim.
Contornei o barraco que você edificou no meu ombro fazendo alongamentos? Pilates? Fisioterapia? Não. Troquei de esporte. Troquei a quadra de handebol pela quadra de squash e sinto que foi nesse momento que você entrou na sua apoteose, nos seus anos dourados: você construiu sua mansão no meu dorso.
Outro golpe duro e, ao meu ver, injusto. Eu havia acabado de virar pai, passei a dormir menos e usar o canguru para andar com Ana pra lá e pra cá. A cada soneca que ela tirava grudada no meu peito, você colocava um tijolinho na sua nova morada e eu ficava algumas horas sem conseguir movimentar o quadril. Injusto, injusto.
Tal qual um colonizador europeu maldito, você finalmente cravou uma bandeira onde lhe convinha, para deixar claro que não há volta, que chegamos em um ponto de não retorno. Fizemos até uma cerimônia de batismo: minha hérnia de disco se chama Clotilde.
Semana passada voltei a pisar numa quadra de handebol, oito anos após a última pelada e quase dezoito após abrir mão, definitivamente, da possível carreira. Foi meio difícil levantar da cama na manhã seguinte, mas o ombro passa bem.
O esporte que mudou minha vida voltará a ter alguma participação nela.
Hoje, 2 de fevereiro de 2025, vivendo uma fase mais madura, gentil e cuidadosa comigo mesmo, te informo que esse texto é uma notificação de despejo.
Um fim bruto para uma grande filha da puta.
Passar bem.
Aposentadoria com o Renda+
Amigos, na semana passada puxei um papo sobre a aposentadoria, bastante inspirado na repercussão desse texto→. Adorei a experiência, quero repetir em breve!
A gravação foi disponibilizada aqui→.
Os programas de acompanhamento (programas? hein?)
São eles: o Dinheiro Sem Medo e o Finanças Para Autônomos. Eles completam 8 anos logo mais (meu deus, como passa rápido). Eu lembro quando gravei a primeira versão da primeira aula, lembro da primeira aluna (obrigado, Erica), lembro do primeiro feedback.
Eles seguem firmes em 2025: maduros, completos, capazes de beneficiar profundamente os que se aproximam. Quatro pilares: as aulas gravadas, os plantões quinzenais, o tira-dúvidas por email e a sessão individual, tudo vitalício.
Tive o prazer imenso de apoiar mais de 3500 alunos até aqui, e eu morro de orgulho deles. Se você gosta da abordagem que utilizo por aqui, eu não poderia recomendar mais. Serão 100 vagas neste primeiro semestre.
Quero entrar na lista de espera→
Ah! Eu atualizei a página do Dinheiro Sem Medo→, deem uma olhadinha em como ficou!
Qualquer dúvida, me dê um oi no WhatsApp: 11-991631373 (é direto comigo, gente, eu não vou te colocar pra falar com um robô).
Um abraço grande e seguimos
meus budas hahahaah seus textos são perfeitos! que delicia lê-los!
Cara, você é um baita educador financeiro, mas porra... como eu amo suas crônicas. Quando eu crescer quero escrever igual você